O treino com eletroestimulação é o treino do momento, está na moda e aparecem cada vez mais academias/ginásios com este conceito.
A promessa de resultados melhores com menos treino alicia qualquer um e convence todo aquele que deseja resultados rápidos com um menor esforço.
O conceito da eletroestimulação muscular na realidade não é novo, nasceu em ambiente terapêutico com o intuito de reforçar a massa muscular, ou seja, estimular a tonificação muscular.
Após observação dos resultados começou a utilizar-se em tratamentos de estética para emagrecimento, adelgaçamento e claro, reafirmação.
Como funciona o treino com eletroestimulação?
As células respondem aos estímulos elétricos recebidos na membrana celular produzindo colagénio.
O colagénio é uma das proteínas mais importantes para a manutenção das células do corpo humano, pois é uma proteína que dá estrutura, firmeza e elasticidade, mantém as células firmes e unidas, sendo não só importante para a integridade dos músculos mas também dos ligamentos, dos tendões e das articulações.
O treino com electroestimulação muscular já era usado pelos atletas olímpicos nos anos 70 para ganho de tónus muscular e também na recuperação de lesões.
Há 20 anos atrás, esta já era uma estratégia utilizada pelos culturistas para estimular e definir os músculos antes de subir ao palco: colocar pequenos aparelhos em músculos estratégicos para os evidenciar. Os resultados eram imediatos!
O grande avanço do treino com eletroestimulação atual são as máquinas. São concebidas especificamente para este trabalho concreto e que permitem trabalhar 350 músculos ao mesmo tempo.
Uma sessão de 20 minutos é equivalentes a 60 ou 90 minutos de exercício físico intenso, logo são recomendados um a dois treinos semanais espaçados, dependendo da condição física do atleta, pois o efeito da eletroestimulação mantém-se por 48 horas.
Mas vejamos o que acontece mais em pormenor, bioquimicamente falando.
Quais os efeitos da eletroestimulação?
O sistema nervoso central é o responsável pelo estímulo elétrico a cada célula.
Milhões de raízes nervosas dividem-se em milhões de recetores que comunicam com cada célula. Quando este estímulo chega à membrana dá-se o potencial de ação. O potencial de ação permite o transporte rápido de informações entre e dentro dos tecidos.
Eles podem ser gerados por muitos tipos de células, mas são utilizados mais intensamente pelo sistema nervoso, para comunicação entre neurónios e para transmitir informação dos neurónios para outro tecido do organismo, como os músculos.
Neste potencial de ação são utilizados iões como o sódio e o potássio, mas também o ião de cálcio. É utilizado nesta reação muito ATP, daí a necessidade de glicose. Nesse caso cabe à molécula de miosina o papel de “quebrar” (hidrolisar) o ATP, libertando a energia necessária para a ocorrência da contração muscular.
Na realidade o que acontece num treino com electroestimulação muscular é um aumento exagerado destas reações ao nível da membrana e isso implica muito ATP disponível e muitos iões também.
Como se processa o treino com eletroestimulação?
É oferecida uma bebida rica em vitaminas e minerais antes do início do treino.
Vestem-se uns calções com 16 elétrodos e um colete com 12 elétrodos e são colocados ainda outros dois elétrodos nos braços. Está então tudo pronto para o início do treino!
A máquina transmite os impulsos elétricos que estimulam os músculos e cada um faz os exercícios mais apropriados à sua condição física e objetivos. O treino é supervisionado por um personal trainer.
Sob o olhar clínico da Dra. Sandra Elói
Ora bem…agora que já ficámos a saber como funciona, coloco a pergunta: será mesmo saudável?
Atualmente, preparo muitos atletas de competição e alta competição. Uma preocupação constante é a suplementação para evitar desgastes excessivos, oxidação celular e desidratação. Aqui parece-me que temos um bocadinho de tudo, talvez um pouco “contranatura”. Possivelmente porque vejo tudo com “olho clínico.
A minha opinião clínica/desportiva é a seguinte:
- Em primeiro lugar porque fui atleta de alta competição e sei como é importante respeitarmos a nossa bioquímica, que é diferente de pessoa para pessoa (as minhas reações químicas orgânicas não são iguais a ninguém, são minhas!)
- Não é possível saber as minhas reservas iónicas, posso ter défice de iões e a bebida que me oferecem no início pode não colmatar esse défice quando iniciar o desgaste excessivo
- O PT que supervisiona o meu treino tem conhecimentos médicos para me fazer uma avaliação correta ao meu estado de saúde?
- Se eu tiver o meu score de cálcio baixo (que me aumenta a probabilidade de enfarte cardíaco), mas não tiver conhecimento, o que me pode acontecer ao potenciar em exagero o desgaste deste ião?
- E se eu tiver problemas de coagulação, onde o ião de cálcio nunca pode faltar?
- O exercício físico excessivo promove oxidação celular…e este é saudável?
- Um estímulo que dura 48 horas? O meu metabolismo não sofre outras alterações?
Existem ocorrências preocupantes, como é o caso de um paciente de 20 anos que foi atendido de urgência com dores musculares fortes logo depois de uma sessão “baseada em exercícios com estimulação elétrica, supervisionada por um profissional de fitness”.
Depois de alguns exames descobriram que o jovem tinha rabdomiólise, um problema grave no qual há uma destruição generalizada das fibras musculares. Este processo leva à libertação de uma proteína chamada mioglobina no sangue, que pode causar problemas nos rins.
Nicola Maffiuletti, do laboratório de desempenho humano na Clínica Schulthess, em Zurique, escreveu um artigo para a revista especializada BMJ, onde ele e outros colegas manifestaram a preocupação com o fato de este treino estar a ser promovido em muitos países; “apesar de provas científicas limitadas de sua segurança e eficácia”.
O Ministério da Saúde de Israel também lançou um alerta recentemente, onde refere: “Os aparelhos de EEM devem ser usados apenas por profissionais de saúde qualificados (primariamente médicos e fisioterapeutas) com o objetivo de diagnóstico e reabilitação. Os dispositivos não devem ser usados em academias. O uso sem supervisão médica pode causar risco à saúde’.”
Posto isto…faça exercício, sim! Adapte-o à sua condição física, respeite o seu organismo, descanse e volte a treinar! Coma bem, hidrate-se e durma bem. Pense nisso!