A adoção de uma rotina na alimentação é comunicada pelos nutricionistas (e outros profissionais de saúde) como um dos pré-requisitos relevantes para uma alimentação saudável.
Quando um indivíduo insere as recomendações alimentares propostas numa rotina, é mais provável que ocorra adesão às mesmas.
Mas qual é a real importância de ganharmos controlo sobre as nossas refeições? Não corremos o risco de cair em monotonia alimentar e ficar mais propensos a querer “furar a dieta”?
4 motivos para manter uma rotina na alimentação
Melhores resultados a longo prazo na manutenção do peso perdido
A evidência científica sugere-nos que a adesão às mudanças alimentares é o principal fator para o sucesso no processo de emagrecimento. No entanto, é estimado que apenas 20% dos indivíduos consegue manter o peso perdido a longo prazo.
Esta perspetiva um tanto desanimadora tem potenciado a investigação na área da gestão de peso, de forma a tentar perceber quais os fatores que são determinantes na manutenção do peso perdido.
Uma das estratégias exploradas tem sido o estabelecimento de uma rotina na alimentação.
A regularidade e previsibilidade da ingestão alimentar poderá facilitar o sucesso da perda de peso a longo prazo, já que os indivíduos que mantém o peso perdido são tendencialmente os mesmos que “não saltam refeições” e que consomem regularmente as mesmas opções alimentares.
Porém, há quem defenda que o estabelecimento de uma rotina alimentar poderá ser sinónimo de monotonia, um fator precipitante para “furar a dieta”. Assim, permitir a flexibilidade alimentar (principalmente durante os fins-de-semana ou férias) poderá ser mais realista a longo prazo.
De forma a perceber qual a estratégia mais eficaz, um estudo comparou indivíduos que mantinham uma rotina alimentar independente do período laboral com indivíduos que se alimentavam de forma mais restritiva durante a semana e permitiam maior flexibilidade ao fim-de-semana.
O que se observou foi que os participantes que apresentavam hábitos alimentares regulares e independentes, eram mais propensos a manter o peso perdido. Estes resultados estão em conformidade com outros estudos realizados recentemente (inclusive em Portugal), destacando novamente a importância de manter uma rotina na alimentação.
Facilita o planeamento prévio das refeições, adequando as porções
Quando não controlamos a nossa rotina alimentar, não planeamos as nossas refeições.
“Depois logo vejo onde almoço” ou “Depois como qualquer coisa no café” são frases que todos já dissemos na azáfama do nosso dia a dia. O problema é quando isto começa a ocorrer de forma sistemática.
As porções alimentares na restauração têm vindo a aumentar ao longo do tempo. Quando nos sentamos na mesa de um restaurante, somos frequentemente coagidos a “comer demais” e a nossa intenção em terminar a refeição é facilmente anulada por influências ambientais.
Um estudo procurou perceber qual o impacto dos estímulos visuais na quantidade de alimento consumida. Para isso, ofereceu aos participantes um prato de sopa “sem fundo” que se enchia autonomamente. O que se verificou foi que a quantidade de alimento consumido aumentou significativamente, sem haver um aumento coincidente na saciedade.
Estes resultados são consistentes com a noção de que a quantidade de comida que nos é disponibilizada e colocada no prato, aumenta efetivamente a nossa ingestão alimentar.
Assim, ao estabelecer uma rotina na alimentação na qual está enquadrado o planeamento das refeições, é possível determinar e, consequentemente, consumir a quantidade de alimento que está adequada às nossas necessidades nutricionais.
Estratégias como a preparação prévia de componentes da refeição ou a utilização de marmita para levar o almoço para o trabalho, para além de nos poupar tempo e energia, permitem estabelecer uma memória futura para a porção alimentar adequada, que afeta positivamente a saciedade após a refeição.
Promove o consumo de refeições mais nutritivas
O estabelecimento de uma rotina alimentar permite não só adequar a quantidade, mas também melhorar a qualidade da alimentação.
Ao cumprir hábitos alimentares regulares, é possível estimar previamente o que vamos consumir nos dias seguintes. Este pressuposto permite que os indivíduos confecionem receitas mais diversificadas e antecipem a compra de ingredientes necessários, o que poderá explicar o aumento da variedade alimentar observado em indivíduos que planeiam as refeições com antecedência.
Para além disso, usufruir de uma rotina alimentar com estas características, está também associado a um aumento do consumo de frutas e legumes e melhor adesão às orientações nutricionais propostas.
Tem um impacto benéfico em fatores de risco cardiometabólicos.
O consumo de refeições de forma regular mostrou ter um efeito benéfico nos fatores de risco cardiometabólicos, como a redução dos picos de insulina e a redução de colesterol-LDL (o chamado “mau colesterol”) e colesterol total em mulheres normoponderais e obesas.
Coincidentemente, um padrão alimentar irregular também parece ser menos favorável para um perfil cardiometabólico saudável, estando associado a um maior risco de obesidade, de pressão arterial elevada e de síndrome metabólica.
Esta associação parece estar relacionada com a ingestão de calorias de forma irregular entre e durante as refeições e não necessariamente com o aumento das calorias totais diárias consumidas.
O consumo de snacks está incluído no conceito de rotina alimentar ou deverá ser limitado?
A evidência científica é pouco explícita ou contraditória em relação ao consumo de snacks alimentares. Isto deve-se principalmente à falta de uma definição padrão do termo “snack” ou pelo menos à falta de concordância dos alimentos que o compõem.
Um snack pode significar um alimento consumido entre refeições, ou pode ser considerado uma refeição intermédia. E tanto pode ser uma peça de fruta e um iogurte, como um pacote de bolachas ou um gelado.
Assim, os estudos que procuraram investigar os efeitos do consumo de snacks têm resultados contraditórios. Podem defender que a ingestão dos mesmos está associada a maior ingestão de açúcares refinados ou que contribui para a ingestão de nutrientes e melhoria da qualidade da dieta (especialmente em crianças pertencentes a famílias de baixo estatuto económico).
O que parece ser coincidente é a conclusão de que a ingestão de snacks está associada a uma maior ingestão de calorias diárias, mas não ao aumento de IMC (Índice de Massa Corporal) ou de fatores de risco cardiovascular (como pressão arterial, glicémia e perfil lipídico – colesterol LDL, colesterol HDL, triglicéridos.
O que podemos concluir?
A rotina alimentar permite não só a promoção da saúde, mas também a prevenção da doença. Ao favorecer hábitos alimentares variados, nutritivos e adequados (quer em quantidade, quer em qualidade), a adoção de uma rotina na alimentação é uma estratégia com potencial de sucesso.
Para além disso, influencia beneficamente uma das etapas do processo de emagrecimento mais exigentes e duradouras: a manutenção do peso perdido a longo prazo.
No entanto, é importante referir que, para potenciar a adesão a um estilo de vida e hábitos alimentares saudáveis, a rotina na alimentação deve ser adaptada às preferências e ao quotidiano do indivíduo. E qual é a melhor forma de garantir que estamos no “caminho” certo? É sem dúvida consultar um nutricionista.