O stress, tanto o físico como o psicológico, é parte integrante da vida de um indivíduo, não representando necessariamente algo negativo. A ansiedade gerada pelo stress pode até ser saudável, já que estimula o avanço e a resolução de muitas situações, desde que não exceda certos limites. No entanto, muitas vezes é referido que o stress engorda. Será esta afirmação totalmente verdadeira?
STRESS: o que está em causa?
É discutido que o stress pode levar à produção e ação de hormonas responsáveis por alterações da ingestão alimentar e da composição corporal. No entanto importa distinguir o tipo de stress e diferenças individuais na resposta à ingestão.
Podemos definir duas vertentes de stress. Por um lado, o psicológico, que se caracteriza como uma condição na qual as expectativas estabelecidas por aprendizagens anteriores ou semelhantes não correspondem às perceções atuais ou previstas do ambiente interno e externo.
Por outro lado, temos o stress do ponto de vista biológico, desencadeado por outros fatores causadores de stress, como a privação do sono, a dor, a inflamação e ainda o uso de terapêuticas com glicocorticoides.
O stress pode ser provocado por várias situações, tais como: trauma (acidental ou cirúrgico), queimaduras, infeção e febre, ansiedade, exercício físico extenuante e hipoglicemia (nível baixo de glicose no sangue). Pode ainda ser classificado como agudo, quando ocorre uma única exposição, ou crónico, quando a exposição é prolongada e/ou repetitiva no tempo.
A perceção e a avaliação do stress pode ser mediada por traços de personalidade, estado emocional e respostas fisiológicas que, juntas, contribuem para a experiência do sofrimento.
STRESS E OBESIDADE
Na literatura recente é descrito que níveis elevados de cortisol de forma persistente, seja por terapêutica clínica ou decorrentes de episódios de exposição prolongada ao stress, estão fortemente relacionados com deposição de gordura na região abdominal, nomeadamente gordura visceral.
Sabe-se de facto que o cortisol, uma hormona glicocorticoide, pode causar uma redistribuição da gordura na região abdominal e, além disso, pode aumentar o apetite, levando a um consequente aumento da ingestão de alimentos densamente energéticos e de alta palatabilidade, os designados de “comfort food”.
Por outro lado, a elevação destas hormonas relacionadas com a resposta ao stress leva a uma inibição da hormona de crescimento, contribuindo para a perda de massa muscular, massa mineral óssea e acumulação de gordura visceral.
Por sua vez, o aumento de gordura na região abdominal e a perda de massa muscular estão associados com doenças como a dislipidemia, a hipertensão arterial e a diabetes mellitus tipo 2, que por sua vez podem originar doenças cardiovasculares.
Assim, e segundo a literatura disponível, em média, os níveis de cortisol a longo prazo parecem ser mais elevados em indivíduos obesos, estando particularmente relacionados ao aumento da massa gorda na região abdominal. No entanto, nem todos os obesos apresentam valores elevados de cortisol, pelo que esta não será uma causa direta da obesidade em todos os indivíduos.
Mas, curiosamente, na sociedade moderna, a pandemia da obesidade coincide com um aumento de fatores externos que estão associados ao aumento do cortisol, como o stress crónico, consumo de alimentos com um alto índice glicémico e perturbações no sono, nomeadamente com a diminuição das horas de sono. Assim, o stress será efetivamente um fator que é importante estarmos atentos.
POSTO ISTO, SERÁ QUE O STRESS ENGORDA?
Respondendo à questão deste artigo, o stress, por si só, não engorda.
É certo que estados de stress crónico elevam a produção e ação de hormonas responsáveis por alterações da ingestão alimentar e da composição corporal. No entanto, não é claro que ocorra em todas as situações de stress, nomeadamente de stress agudo.
É possível observar indivíduos com aumento da ingestão de alimentos e outros, em oposição, com uma supressão da ingestão alimentar, podendo esta situação estar relacionada com a disponibilidade de alimentos de alta palatabilidade no momento.
Assim, as diferenças individuais na resposta à ingestão devem ser consideradas. Aproximadamente 40% dos indivíduos aumentam a ingestão alimentar, 40% diminuem a sua ingestão calórica, enquanto aproximadamente 20% das pessoas não mudam os comportamentos alimentares durante períodos de stress.
Esta heterogeneidade de resultados pode estar relacionada com o tipo específico do agente que desencadeou o stress, duração da provocação ao stress e variações nos níveis de saciedade e fome dos indivíduos submetidos a estes estudos.
Relativamente ao apetite, os efeitos observados dependem do tipo de stress: estudos mostram que os stressores físicos, por exemplo tirar sangue, levam a diminuição da ingestão alimentar, e que os psicológicos, por exemplo, conflitos interpessoais, luto, desemprego, contribuem para o aumento da ingestão emocional.
Desta forma, existem muitos fatores que podem contribuir para os efeitos divergentes na relação entre stress e aumento de peso, entre os quais: tipo e persistência do fator desencadeador do stress, quantidade e tipo de alimentos disponíveis e nível de fome ou saciedade no momento .
Conclusão
O aumento crónico de cortisol poderá levar a um aumento do apetite e consequente ingestão alimentar de alimentos com alto valor calórico e baixo valor nutricional, contribuindo, dessa forma, para um aumento de peso.
No entanto, este aumento parece estar mais relacionado com o aumento da gordura na região abdominal. Sendo que nem todos os indivíduos apresentam valores elevados de cortisol para que exista uma relação bidirecional entre stress e a obesidade, devem sempre ser considerados outros fatores relacionados com comportamentos sociais, dependência alimentar, compulsões alimentares e hábitos alimentares pouco saudáveis, para identificar a origem do excesso de peso ou obesidade num determinado indivíduo.
Estes fatores referidos são os principais responsáveis pela ideia de que o stress engorda.
De qualquer das formas, será efetivamente importante promover o desenvolvimento de estratégias individuais e de saúde pública para a regulação do stress e que promovam comportamentos alimentares saudáveis em pessoas com predisposição para o aumento da ingestão alimentar em situações de crise ou com dependência alimentar.
A terapêutica nutricional, juntamente com o trabalho de gestão psicológica, podem ser estratégias benéficas para a resolução deste estigma, não esquecendo a necessidade de recorrer a profissionais de saúde legalmente habilitados para este tipo de intervenções, nomeadamente nutricionistas e psicólogos.