É comum sentir algum desconforto quando se ingere uma quantidade significativa de alimentos, nomeadamente se estes forem bastante condimentados. No entanto, quando a má digestão é recorrente, outros fatores podem estar associados, para além das refeições. Fique a saber mais sobre este tema.
O Processo digestivo
A digestão corresponde ao conjunto das transformações químicas e físicas que os alimentos orgânicos sofrem ao longo do sistema digestivo, para se converterem em compostos menores hidrossolúveis e absorvíveis.
É uma forma de catabolismo que contempla duas etapas: a digestão mecânica (mastigação) e a digestão química (através da ação enzimática, os alimentos são divididos em moléculas que o organismo é capaz de absorver). Assim, o processo digestivo envolve quatro fases.
- Mastigação: redução dos alimentos a um bolo alimentar.
- Processamento químico e enzimático.
- Processamento ao nível do intestino delgado (onde são absorvidos as macromoléculas e nutrientes).
- Fermentação e remoção da água pelo cólon.
O tempo de digestão é variável de pessoa para pessoa e consoante o tipo de alimentos ingeridos. Em média, podem demorar cerca de 6 a 8 horas até passarem do estômago para o intestino delgado. Em seguida, os alimentos passam ao intestino grosso (cólon), dando-se a absorção da água e finalmente é eliminado o excedente.
Má digestão (ou Dispepsia): o que é?
A dispepsia, mais frequentemente designada de má digestão, é a sensação de dor ou desconforto recorrente nos quadrantes superiores do abdómen e que pode, ou não, estar associada às refeições.
Pode ser classificada em:
- Dispepsia funcional, quando não existe qualquer causa, ou seja, não existe doença associada;
- Dispepsia orgânica, que está relacionada com uma patologia – o diagnóstico inclui a realização de exames laboratoriais, endoscopia digestiva alta e exames imagiológicos.
Sintomas
Os sintomas mais comuns da má digestão são:
- Saciedade precoce – a saciedade é atingida após comer uma pequena porção de alimentos;
- Saciedade desconfortável após a refeição – muitas vezes designada de “sensação de enfartamento”;
- Desconforto abdominal;
- Inchaço abdominal;
- Azia;
- Eructação (ato de arrotar);
- Náuseas e vómitos.
Causas
As causas mais comuns da dispepsia são:
- Úlceras gástricas ou duodenais;
- Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE);
- Gastrite;
- Perturbações da motilidade intestinal;
- Cancro do esófago ou estômago;
- Bloqueios intestinais;
- Obstipação;
- Infeção pela bactéria Helicobacter pylori (causa mais comum da gastrite e úlceras pépticas).
Fatores de risco
Alguns comportamentos aumentam significativamente o risco de desenvolver dispepsia:
- Ingestão de alimentos muito condimentados (picantes, caril, gengibre, carnes vermelhas, fritos e molhos);
- Consumo excessivo de estimulantes (álcool e cafeína);
- Consumo de bebidas carbonatadas (refrigerantes ou agua com gás);
- Comer demasiado depressa, ou em quantidades excessivas;
- Tabagismo;
- Ansiedade e depressão;
- Toma frequente de medicação (anti-inflamatórios e antibióticos).
Quando deve consultar um médico?
Quando a dispepsia é acompanhada de outros sintomas como perda de peso, vómitos e náuseas constantes, disfagia (dificuldade em deglutir), odinofagia (dor ao deglutir), anemia, icterícia ou ainda sangue nas fezes, deve-se consultar um médico.
As especialidades que tratam a dispepsia são a Medicina Geral e Familiar e a Gastroenterologia.
Exames de diagnóstico
A história clinica e o exame físico são habitualmente suficientes. No entanto, caso existam outros sintomas associados como a perda de peso ou vómitos persistentes, outros exames podem ser solicitados.
- Endoscopia Digestiva Alta: é o exame mais importante para o diagnóstico de dispepsia. Consiste na observação direta do revestimento interno do esófago, estômago e duodeno. Através de uma biópsia, é possível pesquisar a existência de infeção por Helicobacter pylori. É recomendado a pessoas com idade superior a 55 anos ou mais jovens, caso a dispepsia seja acompanhada de outros sintomas (perda de peso ou vómitos persistentes).
- Estudo Imagiológico do Aparelho Digestivo: exame radiológico do aparelho digestivo, Tomografia Computorizada ou ainda a Ultrassonografia.
- Análises clinicas.
Tratamento
Na maioria dos casos, o tratamento da má digestão passa pela mudança de hábitos alimentares e de vida.
- Alimentação equilibrada e saudável, dando preferência a frutas, legumes, verduras, grãos integrais e alimentos não processados.
- Reduzir o consumo de alimentos de difícil digestão, como chocolate, carnes com elevado teor de gordura, bebidas gaseificadas e alcoólicas, alimentos condimentados (pimenta, caril, gengibre), alimentos fritos e molhos, alimentos processados e de charcutaria.
- Mastigar devagar para facilitar a digestão e otimizar a ação dos sucos digestivos.
- Realizar refeições de pequeno volume e fracionadas ao longo do dia (3 refeições principais e 2 intercalares), para reduzir o trabalho gástrico durante o processo digestivo;
- Ter horários regulares para as refeições.
- Evitar deitar-se ou sentar-se após a refeição (fazer uma caminhada de 20 minutos após a refeição é o ideal).
- Reduzir o consumo de tabaco, café e chá.
- Ter um peso dentro dos valores recomendados.
- Reduzir os níveis de stress e ansiedade.
- Praticar exercício físico com regularidade (melhora o trânsito intestinal, reduz o stress e controla o peso).
- Por vezes, é necessário recorrer a medicação: procinéticos, inibidores da bomba de protões, antibióticos ou antieméticos.