Muitas atletas femininas têm dúvidas acerca dos efeitos da menstruação na performance desportiva. Com efeito, as alterações do eixo reprodutivo verificadas durante a menstruação podem influenciar tanto a saúde como a performance.
Entre a menarca e a menopausa, as mulheres que não fazem uso de contracetivos têm um ciclo menstrual mensal, caracterizado por alteração nas concentrações de hormonas sexuais. Alguns dos sintomas descritos por estas mulheres incluem dismenorreia (dores menstruais), náuseas, dores de cabeça, fadiga e diarreia.
Como é óbvio, todos estes sintomas podem afetar diretamente a performance. Na verdade, um estudo concluiu que cerca de 51% das atletas sente que os sintomas do ciclo menstrual afetam negativamente os seus treinos e a sua performance.
Embora seja lógico que todos estes sintomas afetam a performance, persiste a dúvida acerca do real papel que as flutuações hormonais têm na qualidade dos treinos e do desempenho competitivo destas mulheres.
Efeitos da menstruação na performance desportiva
O que acontece durante o ciclo menstrual?
O ciclo menstrual é composto por uma série de fases consecutivas, caracterizadas por flutuações nas concentrações das duas principais hormonas femininas, o estrogénio e a progesterona.
Um ciclo menstrual “perfeito” dura cerca de 28 dias e é normalmente dividida em três fases:
- Fase folicular, caracterizada por níveis baixos de estrogénio e progesterona;
- Fase ovulatória, caracterizada por níveis elevados de estrogénio, mas baixos de progesterona;
- Fase lútea, caracterizadas por níveis elevados de estrogénio e progesterona.
Esta última fase é essencial para a inibição da estimulação da hipotálamo, frenando a produção de hormona luteinizante (LH) e de hormona estimuladora do folículo (FSH), compostos essenciais para o processo de maturação dos folículos do ovário.
A performance desportiva é afetada pelo ciclo menstrual?
Embora estas alterações nos níveis de hormonas possam afetar a performance desportiva, até à data, a informação disponível é inconsistente. No entanto, uma revisão sistemática e meta-análise recente decidiu compilar todos os dados disponíveis relativamente ao tema.
Neste estudo, os autores concluíram que, comparativamente às outras fases, a performance desportiva pode ser ligeiramente pior na fase folicular, ou seja, as diferenças de performance podem ser ligeiramente inferiores quando os níveis de estrogénio e progesterona são naturalmente mais baixos.
Resultados semelhantes que podem ser associados com alterações hormonais foram ainda relatados noutros trabalhos. Um estudo recente concluiu que a pílula – utilizada para reduzir os níveis naturais de estrogénio e progesterona durante o ciclo – pode ter um impacto negativo na performance desportiva.
Na verdade, o perfil hormonal endógeno crónico das atletas que tomam a pílula é comparável ao perfil das restantes durante a fase folicular, precisamente aquela na qual foram detetadas piorias na performance.
Salienta-se, no entanto, uma limitação do estudo em questão, reportada pelos próprios autores. Cerca de 42% dos 78 estudos selecionados acerca do tema são o que chamamos de evidência de baixa qualidade.
Isto significa que os dados dos estudos carecem de mais confirmação de forma a determinar o real impacto do efeito – fase folicular – no parâmetro avaliado – performance. Neste caso, o efeito da fase folicular na performance desportiva é menos do que pequeno.
Por outro lado, é importante perceber que o efeito do ciclo menstrual na performance foi muito variável entre os estudos, fazendo com que a tarefa de tirar uma conclusão consistente seja muito difícil.
Quando ao pequeno tamanho do efeito juntamos a inconsistência e a baixa qualidade dos estudos, não podemos sequer especular quanto a possíveis recomendações para atletas femininas durante o ciclo menstrual.
Conclusão
Embora os resultados apontem para um efeito trivial da fase folicular na performance desportiva, é bem provável que este seja tão pequeno que se torna insignificante para a maioria das atletas femininas.
No entanto, qualquer pequeno efeito pode ser relevante para atletas de elite, onde a diferença entre a vitória e a derrota é marginal.
Neste sentido, é recomendável que os profissionais que trabalham com estas atletas acompanhem de perto os seus ciclos menstruais e que tenham noção que em determinadas fases a performance pode ser ligeiramente inferior (fase folicular) ou superior (fase ovulatória e fase lútea).
Uma última nota vai para as atletas que usam contraceptivos orais. Estes fármacos não fazem mais do que libertar quantidades pequenas, mas constantes, de análogos das hormonas femininas – etinilestradiol e progestina – que inibem a produção de hormona luteinizante (LH) e hormona estimuladora do folículo (FSH), impedindo assim o crescimento do folículo e a gravidez.
As principais razões relatadas pelas atletas para a utilização de contraceptivos orais prendem-se obviamente, com a performance. Para algumas mulheres, o ciclo menstrual é mais uma razão de preocupação durante o período competitivo e outras podem ter sintomas que afetam negativamente a performance como dores menstruais, vómitos, dores de cabeça e flutuações de humor.
Como referido anteriormente, o perfil hormonal regular destas mulheres é comparável com o das mulheres que não tomam a pilula, durante a fase folicular.
Artigo originalmente publicado em Novembro de 2020. Atualizado em Setembro de 2022.