Share the post "Suplementação com creatina e glutamina pode fazer a diferença?"
Antes de escolher e usar um suplemento é necessário avaliar os riscos, os benefícios, a adequação ao objetivo e ao indivíduo, a eficácia, a segurança e, por último, se existe evidência científica sólida que sustente a validade do mesmo (1). Neste artigo serão abordadas estas dimensões sobre dois dos suplementos mais usados, creatina e glutamina.
O papel da nutrição é amplamente visto como coadjuvante na prática de exercício físico tanto na área do fitness, como no aumento da performance desportiva. Em adição, o uso apropriado de suplementos nutricionais pode representar um pequeno contributo para a otimização do rendimento desportivo (1).
A escolha e o uso de suplementos dependem das diferentes finalidades, sendo de destacar as principais: aumento do desempenho físico, manutenção do estado de saúde, recuperação de lesões, combater deficiências em micronutrientes e macronutrientes, e fornecer a energia adequada quando é difícil somente através da ingestão alimentar (1).
Creatina: mecanismo de ação, utilização e segurança
A creatina é um composto orgânico derivado de três aminoácidos (arginina, metionina e glicina), sintetizada primeiramente nos rins e posteriormente no fígado (~1g/dia) e está envolvida no metabolismo energético (2, 3, 4). Pode ainda ser obtida na dieta através do consumo de leite, carne vermelha e branca, peixe e moluscos.
Uma dieta omnívora fornece 1 a 2 g de creatina por dia, no entanto este valor poderá alterar-se devido à influência da forma e do tempo de cozedura do alimento (2).
Uma vez que a ingestão pela dieta comum e a síntese endógena pode ser insuficiente (~ 50% das necessidades), e tendo em conta o objetivo, muitas vezes é necessário recorrer à suplementação (3). A creatina – nomeadamente a monohidratada, forma com maior biodisponibilidade – faz parte do grupo de suplementos implicados com o aumento da performance desportiva, principalmente em exercícios curtos de intensidade máxima e em planos de treino com a mesma característica (p.e. musculação), levando a maiores ganhos de massa magra, força e potência muscular (1, 2).
Mecanismo de Ação
A suplementação em creatina aumenta as reservas de creatina muscular, sendo o músculo esquelético o seu principal reservatório (~95%), aumentando consequentemente a taxa de síntese de fosfocreatina (Pcr), melhorando a resposta a exercícios curtos e de alta intensidade, aumentando a capacidade de repetições sob esforço (1).
Em suma, a creatina serve como substrato energético para a contração do músculo esquelético (fibras tipo II), aumentando a velocidade de produção de adenosina trifosfato (ATP) através do aumento da fosforilação oxidativa do difosfato de adenosina (ADP) com Pcr na mitocôndria (2).
Como utilizar
Existem, atualmente, dois protocolos de utilização deste suplemento, ambas com validade científica (1):
– Primeiro protocolo: com ciclo (1, 2, 3):
- Fase de loading: 0,3g por kg de peso corporal (20 a 25g), em 4 tomas diárias, durante 5 a 7 dias
- Fase de manutenção: 0,03 g/kg/dia, cerca de 3 a 5g/dia durante 3 semanas
- Fase de wash-out: 1 a 2 semanas sem tomar creatina
– Segundo protocolo: sem ciclo (3): 5 a 10g/dia de forma contínua.
A diferença destes dois protocolos é a presença ou ausência da fase de carga. Com a utilização do ciclo, o ponto de saturação da creatina é rapidamente atingido, resultando em maior peso corporal (via retenção de água) e no aumento agudo de força. Caso não siga o protocolo com fase de carga, também irá atingir o ponto de saturação, no entanto levará mais tempo.
A toma da creatina juntamente com uma fonte de hidratos de carbono e/ou proteína pode otimizar o processo de retenção de creatina no músculo, por via da estimulação da insulina (1, 5).
Pode ocorrer diarreia e náusea quando é suplementada uma elevada dose de uma só vez. Neste caso, as doses devem ser espaçadas ao longo do dia.
Segurança
Vários estudos não mostraram efeitos negativos para a saúde, desde que o procedimento da toma seja apropriado, no entanto estudos a longo prazo são limitados (1,2).
Relativamente à função hepática e renal aquando o uso deste suplemento, não foram identificados prejuízos em pessoa saudáveis (2,4).
Glutamina: mecanismo de ação, utilização e segurança
A glutamina é um aminoácido semiessencial, isto é, o corpo tem a capacidade de o sintetizar, no entanto pode ser considerado essencial durante situações de catabolismo aumentado (por exemplo: sepsis, infeção e situações pós-cirúrgicas), ou de desgaste muscular provocado por trauma. Nestas situações poderá ser necessário recorrer à suplementação, com supervisão médica (6, 7).
O que é e qual a sua função?
A glutamina é o aminoácido livre mais abundante no corpo (~60%), produzido essencialmente no músculo esquelético e encontra-se em maior quantidade no tecido muscular esquelético e em circulação no plasma e desempenha um papel fundamental em diversas vias metabólicas (6, 7, 8).
Pode encontrar este aminoácido na alimentação diária, mais especificamente em alimentos com maior teor de glutamina como o leite e derivados, carne, peixe e ovos. Sendo que, o ser valor é maior quando falamos de suplementos de proteína de soro de leite (whey) ou caseína (7).
A glutamina é usada como fonte preferencial de energia, em detrimento da glicose, nas células do sistema imunológico (particularmente os linfócitos) e no sistema gastrointestinal (7).
No entanto, quando se fala da associação da glutamina com a construção muscular, verifica-se que não existe evidência científica que comprove esta associação em indivíduos saudáveis.
Como usar
Devido à relativa ineficiência da suplementação em glutamina, para o aumento da massa muscular e performance desportiva, não existem doses recomendadas.
Uma dose de aproximadamente 5g a 15g, é suficiente quando o objetivo é a saúde intestinal ou para atenuar uma provável deficiência relativa em casos de dietas vegetarianas.
Segurança
No que diz respeito ao uso de glutamina como suplemento, pensa-se que o seu uso seja relativamente seguro e bem tolerado pela maioria das pessoas, não sendo recomendado em pessoas com patologias renais.
O limite de segurança observado é de 14g/dia sob a forma de suplemento. Caso faça suplementação com Whey ou Caseína esta dose terá que ser ajustada. Não existe evidência suficiente para sugerir doses mais elevadas, uma vez que os estudos são escassos (7, 9).
Conclusão
Relativamente à questão inicial sobre o uso de creatina e glutamina, se o seu objetivo for o aumento da performance, de massa muscular, força e potência muscular, a creatina poderá ser um suplemento a considerar, que, à partida, não lhe trará prejuízos em tomas adequadas e controladas.
Relativamente à glutamina, e devido à fraca evidência científica, aparentemente o seu consumo via suplementação não lhe trará efeitos a nível da composição corporal e do desempenho desportivo (8).
Assim como qualquer outro suplemento, a creatina e glutamina devem ser aconselhadas e tomadas com a supervisão de um profissional especializado. Aconselhe-lhe com o seu nutricionista.
- Maughan, R.J. et al. (2018). IOC consensus statement: dietary supplements and the high-performance athlete. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/29540367
2. Butts, J. et al. (2017). Creatine Use in Sports. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/29059531
3. Andres, S. et al. (2017). Creatine and creatine forms intended for sports nutrition. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28019093
4. Souza e Silva, A. et al. (2019). Effects of Creatine Supplementation on Renal Function: A Systematic Review and Meta-Analysis. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/31375416
5. Green, A.I. et al. (1996). Carbohydrate ingestion augments skeletal muscle creatine accumulation during creatine supplementation in humans. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/8944667
6. Cruzat, V.F. (2019). Glutamine and Skeletal Muscle. Disponível em:
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/B9780128104224000178?via%3Dihub
7. Gleeson, M. (2008). Dosing and Efficacy of Glutamine Supplementationin Human Exercise and Sport Training. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18806122
8. Ramezani Ahmadi, A. et al. (2018). The effect of glutamine supplementation on athletic performance, body composition, and immune function: A systematic review and a meta-analysis of clinical trials. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/29784526
9. Shao, A. et al. (2008). Risk assessment for the amino acids taurine, L-glutamine and L-arginine. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18325648